domingo, 30 de setembro de 2007

Álvaro de Campos


"Talvez não seja mais do que o meu sonho...
Esse sorriso será para outro, ou a propósito doutro,
Loura débil...
Esse olhar para mim casual como um calendário...
Esse agradecer-me quando a não deixei cair do eléctrico,
Um agradecimento...
Perfeitamente...
Gsoto de lhe ouvir em sonho o seguimento que não houve
De conversas que não chegou a haver.
Há gente que nunca é adulta mas prematura!
Creio mesmo que pouca gente chega a ser adulta - prematura -
E a que chega a ser adulta e prematura morre sem dar por isso.
Loura débil, figura de inglesa absolutamente portuguesa,
Cada vez que te encontro lembro-me dos versos que esqueci...
É claro que não me importo me nada contigo
Nem me lembro de te ter esquecido senão quando te vejo,
Mas o encontrar-te dá ser ao dia e ao destino
Uma poesia de superfície,
Uma coisa a mais no a menos da improficuidade da vida...
Loira débil, feliz porque não é inteiramente real,
Porque nada que vale a pena ser lembrado é inteiramente real,
E nada que vale a pena ser real vale a pena."

25 de janeiro de 1929
(Poemas de Álvaro de Campos. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1999, p. 276-7).

Este poema de Álvaro de Campos não tem título. Destaco o seguinte trecho: "Mas o encontrar-te dá ser ao dia e ao destino." Fujo da temática do poema e pinço este verso, não o encontro casual de que trata o poeta, mas o encontro que muda um dia, ou aquele momento especial que muda o dia. O que o dia nos preparou, o que o destino nos reserva, não sabemos, mas sempre há momentos mágicos que evocam a alegria e a beleza do encontro, do sorriso, do recado simples que aquece a alma.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Vocação


Nessa época eu já falava em vocação, que vem a ser a vontade de fazer isto e não aquela outra coisa eventualmente mais proveitosa e até mais fácil: Vocare, aprendi nas aulas de latim. O chamado. Obedecer a esse chamado é uma destinação e não condenação, porque nesta entra o amargor que transforma o escritor numa esponja de fel. Obedecer à vocação seria simplesmente exercer o ofício da paixão, era o que me ocorria quando diante da pequena mesa abria o estojo com as canetas, escolhia pena preferida, molhava no tinteiro e começava a escrever minhas histórias. Mas tomando o cuidado para não sujar os dedos, esfregar o mata-borrão melhorava, mas cuidado com a blusa!

Vocação seria então apenas isto, atender ao chamado sem se preocupar com o resultado, cumprir o aprendizado da paciência e do amor.”
(Lygia Fagundes Telles. Conspiração de Nuvens. Rio de Janeiro : Rocco, 2007, p. 128-9)

Todos nós temos uma vocação, um chamado, quer profissional, quer na vida de um modo geral. As palavras de Lygia Fagundes Telles fizeram-me pensar na minha vocação profissional que abracei com tanta paixão. Sou advogado e nutro um amor incondicional pelo Direito e pelo ofício que escolhi.

Nestes 14 anos como advogado – sempre como advogado -, nunca pensei em seguir uma carreira pública, nunca me passou pela cabeça tomar outro rumo na vida. Confesso que advogar não é tarefa fácil. É um ofício solitário, pois passamos horas e horas estudando, escrevendo, pensando. Por vezes, revela-se ingrato e cruel diante de situações injustas. A recompensa e a satisfação profissional decorrem do amor ao Direito. O cliente raramente reconhece a dedicação do profissional e muitas vezes não paga o valor previamente acordado dos honorários.

Advogar é uma constante indignação sadia, é não se conformar com a situação, é lutar incansavelmente pelo direito do cliente. É preciso lutar e perseverar, vencendo o desânimo que aparece quando se é derrotado. Isto exige buscar energias e renovar o ânimo constante de luta.


Tenho colegas, que cansados da labuta profissional, sonham em mudar de área, em partir para outra profissão ou abrir um negócio que não tenha nada a ver com o Direito. Não penso assim, porém tenho uma teoria de que muitos jovens advogados vão se desiludir com a profissão. Não há retorno rápido, não há sucesso fácil e não se fica rico da noite para o dia, pelo menos se o profissional atuar eticamente. Para se ter sucesso na profissão, é preciso abraçar a vocação sem se preocupar com o resultado, e seguir adiante com paciência e amor.


Post relacionado: Trabalho e Emprego

Tucanou?

Frase do dia do presidente Lula:

"Eu não faço barganha, faço acordo programado."

Acho que o Lula tucanou.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Dicas da Dani: Colbie Caillat


Primavera começou fria e cinza em São Paulo. Um pouco de música para embalar estes dias primaveris.



Colbie Caillat é uma jovem cantora americana de 22 anos, que canta músicas num estilo soul / folk. Boa música, segundo a cantora, deve aquecer sua alma, fazê-lo se sentir bem e levantar o astral. O álbum de estréia Coco contém músicas neste estilo. Ao ouvir as músicas, é impossível não se lembrar de Norah Jones e Jack Johnson.

"If you listen to an album like Fleetwood Mac's Rumours, every song has its place," diz ela. "If you took one away you'd spoil the balance of the entire record. That's the kind of album I wanted to make. It wouldn’t feel right to have my name on a record that was just a few good tracks and then lots of filler."

No site da cantora no My Space é possível ouvir a todas as músicas do álbum e fazer uma degustação. Bubbly é a primeira música do álbum a tocar em rádios brasileiras. As letras das músicas estão no blog de Colbie para quem quiser conferir.
Vale a pena dar uma conferida!


terça-feira, 25 de setembro de 2007

Blog Jurídico

Lançamos na semana o Blog - Informativo Legal.

Trata-se de um blog com conteúdo jurídico e cuja equipe de editores é composta por advogados em São Paulo e no Rio de Janeiro. A idéia é divulgar notícias jurídicas da área empresarial e informações jurídicas para o cidadão, bem como artigos técnicos.

Visitem, comentem, critiquem e façam sugestões.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Lula e o New York Times

O presidente Lula deu uma entrevista ao New York Times. Foi a primeira vez que falou ao jornal desde que Larry Rother escreveu que o nosso presidente tinha uma quedinha pela branquinha. Lula queria expulsar o jornalista do país, lembram-se?

Na entrevista, Lula disse que duvida que José Direceu seja condenado pelos crimes que está sendo acusado.

Agora pergunto: se Lula não sabia - e não sabe de nada -, como é que ele pode opinar sobre a eventual condenação de Zé Dirceu? Contraditório ou será que o presidente se entregou?

sábado, 22 de setembro de 2007

A Casa de Machado


Quase 2 dias no Rio de Janeiro e volto cada vez mais encantado pela cidade. Fui a trabalho, mas como ninguém é de ferro, aproveitei para conhecer um pouco mais do que ela nos oferece.


Ando pelo Centro do Rio sem medo, pois acho-o muito semelhante ao Centro de São Paulo em termos de quantidade de gente que circula. As ruas do Centro do Rio, porém, são mais estreitas e guardam um ar antigo mais presente, pois algumas ainda são de paralelepípedos. Cumprido o dever, caminhei pelas ruas do Centro em direção à Academia Brasileira de Letras.


Não estava nos meus planos passar por lá, mas seja por uma intuição divina ou por um sussurro do pensamento, uma daquelas idéias que surgem aparentemente de forma simples e que depois se revelam geniais, dirigi-me para a Casa de Machado e dos imortais. A ABL foi fundada na tarde de 20 de julho de 1897 e completa este ano 110 anos. Machado de Assis foi seu primeiro presidente.


"Tarde de sol de uma quinta-feira. Subo a velha escada de pedra da Academia e sigo na direção da estátua de Machado de Assis, gosto de ficar olhando para o bruxo sentado com sua bigodeira e o pince-nez ajustado ao nariz forte, a fronte espaçosa e pensativa. Ando um pouco em redor e acabo por me sentar num banco próximo, ainda é cedo para sessão." (Lygia Fagundes Telles. Conspiração de Nuvens. Rio de Janeiro : Rocco, 2007, p. 33).


Talvez tenha sido este trecho de Lygia Fagundes Telles que me guiou até lá, movido pela curiosidade de ver e vivenciar o que ela descreveu em seu novo livro. Fiz o mesmo percurso. Subi as escadas numa quinta-feira, a lua já no céu do entardecer. Encontrei o Petit Trianon iluminado e repleto de imortais e mortais que se acomodavam para ouvir uma conferência sobre fotografia e a forma de olhar o Brasil. Os Acadêmicos acomodados nas cadeiras centrais da bela sala.


Parei diante de Machado de Assis sentado e observei-o por alguns instantes. Final de tarde e sentei-me num dos bancos diante do bruxo, como o fizera a imortal Lygia Fagundes Telles, e fiquei proseando. Ao terminar a conferência, ganhei um tour daquelas belas salas, de arquitetura clássica.


Um final de tarde agradabilíssimo e inesquecível em grande companhia.


* * * * * *


Vale informar que a ABL tem um serviço denominado ABL Responde que esclarece, de forma gratuita, dúvidas sobre ortografia. Tudo funciona por email. Há no site também acesso ao Vocabulário Ortográfico, que funciona para tirar dúvidas de ortografia de última hora e quando não se tem um dicionário à mão.




quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Poesia: REAL INTANGÍVEL



REAL INTANGÍVEL


O que sinto não compreendo

Seria dor?

Seria devaneio e ilusão?

Seria real, quando tudo parece intangível?

Sinto minhas entranhas doloridas

Amuado, meu espírito sucumbe

Prostrado no chão o corpo

Olhos fechados para te ver

E sua imagem projetar no sonho

Como posso amar o que não vejo?

Como seguir teus passos

Como beijar tua boca

Como ter-te em meus braços

Distância insuperável

Barreiras intransponíveis

Mas a alma te implora e deseja

O coração te anseia

Só me resta sonhar

E rezar...


(RLBF - nov 2006)

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

O Bush tá com um medo...

Ler e ouvir as declarações do presidente Lula têm um conteúdo humorístico imbatível. Rio tanto das coisas que o Lula fala, quanto do que o José Simão escreve.

Na Espanha, o presidente Lula declarou em entrevista coletiva, que ele vai intimar o Presidente George Bush, num encontro no dia 24 próximo, para que ele resolva a crise financeira americana para que ela não afete o Brasil!!!!

O Bush deve estar morrendo de medo do lobo mau!!!

Se o que Lula falasse adiantasse alguma coisa, seus subalternos já teriam resolvido o problema do caos aéreo, da segurança pública, da saúde em estado de coma, da educação frágil....

Bom, se a entrevista coletiva foi depois do almoço, então aí tudo se explica. Devem ter servido sangria para acompanhar a refeição.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Capítulos

(Le Philosophe, de Herve Thibault)


A vida é feita de capítulos. Alguns recheados, outros mal redigidos, outros inacabados. Muitos redigidos com capricho e letra de caligrafia. Poucos com garranchos e hieróglifos ininteligíveis, que na verdade procuramos esquecer. Capítulos ainda por escrever sem sabermos ao certo quantos serão. Recebemos folhas avulsas, que vão sendo preenchidas e depois esperam para ser encadernadas numa bela capa.

O primeiro capítulo é o das memórias mais enevoadas. A infância passa rápido e mal recordamos da maioria das coisas. Tudo parece grande, tudo parece demorar – principalmente quando se quer um brinquedo. Brincadeiras e descobertas, e não raro, algumas cicatrizes físicas. O tombo da bicicleta, um braço quebrado, a queda da árvore, o joelho ralado. Estas lembranças ficam marcadas e podem sempre ser descritas em detalhes. O tempo não afeta nossa memória destas marcas.

Sucede-se, então, o capítulo da adolescência. Tumultos e revoltas, hormônios em ebulição. O sorriso daquela menina deixa de ser um mero sorriso, os pais passam a nos envergonhar, algumas discussões se tornam mais freqüentes. Tudo se resolve e tudo se amaina quando chega a faculdade. Nesta hora, a responsabilidade bate à nossa porta e inicia-se o capítulo mais longo, mais rico de memórias, de sentimentos, de lágrimas, de alegrias.

Estes capítulos formam toda uma enorme seção ou talvez alguns tomos de páginas. E sem dúvida, haverá páginas de perdão, páginas de tristeza, páginas de vitórias e alegrias, páginas esquecidas e outras apagadas. Estas páginas todas costuradas por um pano de fundo que permeia toda esta fase e nos acompanha sempre: os pais e os amigos.

Nunca falham e sempre haverá uma linha ou duas dedicadas a eles. Invisíveis? Por vezes, mas sempre presentes a um simples pedido de colo ou de carinho. Talvez não tenham um capítulo próprio, mas sem eles, não seríamos o que somos hoje.


Palavras de Flaubert

Gustave Flaubert é um dos maiores escritores franceses. São dele as palavras trazidas por Josué Montello em seu Diário da Noite Iluminada:

"Lição de Flaubert: 'Cada sonho acaba por encontrar a sua forma, já que há ondas para todas as sedes, assim como há amor para todos os corações.' E é dele, ainda, no mesmo texto epistolar: 'Já que não podemos deslocar o sol, ponhamos cortinas em nossas janelas e acendamos os lustres de nossos quartos.'" (Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1994, p. 446)

Desloquemos o sol para dentro de nós mesmos e irradiemos o brilho do sorriso, daquele sorriso que contagia e semeia novos sorrisos ao seu redor. Raras são as pessoas que conseguem fazer isto, mas a verdadeira amizade sempre semeia sorrisos.

domingo, 16 de setembro de 2007

Personagens e ficção


Esta semana escrevi um conto para um concurso literário organizado por uma editora carioca. O tema do conto era o medo. Não o medo comum de coisas corriqueiras como altura ou barata, mas dos medos mais profundos, do medo de se expor, do medo da vida, do medo da morte, do medo de errar. A primeira versão do conto não me agradou. Achei o final previsível e deixei o protagonista adormecer por uma semana. De repente, parece que o personagem do conto sussurrou-me seu destino e o final foi alterado.

Interessante como, depois de finalizado, ouvi de duas pessoas idéias muito semelhantes às que tinha colocado no conto, como um reflexo do medo sentido e enfrentado por Octavio, o protagonista.

O processo criativo e a formação de personagens têm me intrigado, pois resolvi abraçar a idéia de escrever um livro. Josué Montello escreveu que seus personagens tinham sempre um referencial de alguém conhecido, todos eles já existiram de alguma forma em alguma pessoa de seu convívio. Trilhas reais que ganham trilhas de ficção.

Lygia Fagundes Telles, na crônica “Bolas de Sabão” (Conspiração de Nuvens. Rio de Janeiro : Rocco, 2007, p.17) retrata algumas conversas com leitores acerca de seus personagens. É curioso como alguns personagens ganham vida própria, deixam de ser meros produtos da ficção e são considerados como figuras históricas de um passado – recente ou não. Eles ganham vida própria como bolhas de sabão que se desprendem do criador e alçam vôo na atmosfera, até que estouram e desaparecem, como ocorre com o final de um livro. Alguns autores afirmam que depois que o livro é concluído, ganha vida própria, foge ao controle do escritor.

E Lygia Fagundes Telles termina assim sua crônica:

Aparetemente não pensei mais no assunto mas quando um dia me sentei para escrever A estrutura da bolha de sabão já tinha intuído que a imagem da bola era a imagem do amor. E a estrutura dessa bola? Calma, pensei, era preciso inventar um enredo que envolvesse essa imagem. E só lá adiante vou descobrir (ou não) como funciona essa tal de estrutura que deve ser assim como o próprio ser humano, indefinível, inacessível. E incontrolável.” (p. 23)


E este mistério humano continua a nos intrigar e cativar. E nos inspira a escrever!

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Ainda a revolta dos blogs

Vários blogs lançaram nesta semana uma tática de Google Bombing. Traduzindo isto significa criar um link determinado de modo a que o algoritmo de busca do google faça com que determinada expressão figure em primeiro lugar nos resultados.

Então, meus caros leitores, digitem "vergonha nacional" no google e esperem a resposta.

Seria coincidência ou não?

Vox populi vox Dei!

Revolta blogueira


Não precisa procurar muito para perceber a revolta na blogosfera acerca da absolvição do Senador Renan Calheiros. São muitos brasileiros insastisfeitos e descontentes. E junto com muitos outros vou continuar a bater e a falar. Quem sabe agora a oposição não acorda e derruba a CPMF?


Seria lindo ver o tiro sair pela culatra e aí, o nosso presidente vai ter engolir do próprio remédio. Como ele disse, precisamos nos acostumar a aceitar as decisões das instituições. Está na hora da "instituição" mostrar a cara e derrubar a cpmf.


XÔ CPMF!!! Estamos juntos nesta campanha!


quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Renan Absolvido?!

Estou tão revoltado com a absolvição do Senador Renan Calheiros que não sei nem o que escrever.

Se Renan é um homem ético, se como disse o presidente Lula ninguém tem mais autoridade ética e moral neste país que o PT, então chego à conclusão que sou um homem anti-ético. Acho que vou comprar umas vaquinhas no interior para justificar uma eventual encheção da Receita Federal, ou então arrumar uns laranjas para dividirem comigo uma participação em algum canal de televisão.

Estou estupefato, horrorizado com a falta de respeito com os eleitores.

Em São Paulo, posso afirmar que nunca votei nos Srs. Aloizio Mercadante e Eduardo Suplicy. E nunca votei porque não confio neles. Basta ver como eles votaram!

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Crônica: Antenada

(Foto do extraída do site Ana Carmen)

Foi com a mãe aproveitar a tarde de sábado, estranhamente quente para o final de inverno, e dar um passeio no shopping. Só as duas, com tempo para ver as vitrines, lojas, experimentar roupas e conversar. Programa de mulher, sem companhia dos homens, o que aliás tinha o costume de deixar estes passeios meio atribulados. Melhor assim, só as duas.

A tarde passou rápido e as vitrines se sucediam com uma certa semelhança de modelos, estampas e cores. A moda do verão já preenchia os manequins expostos, todos com cores vivas e apropriadas ao calor. Foi então que Mariana percebeu que ele estava certo, ele tinha razão: ela era uma mulher que antecipava tendências. A infinidade de bermudas para mulheres, que davam o tom do visual feminino de verão, havia sido o traje escolhido por ela para a festa de fim de ano da empresa em que trabalhava. Só que isto tinha sido no ano passado. Ela havia acertado de novo, estava à frente das amigas, o que causava uma certa inveja silenciosa.

Ela sempre acertava, mas nunca dera muita bola para isto. Achava que tinha bom gosto, mas nunca se considerara antenada. Com sapatos, sim, algo que adorava. E que mulher não gosta de sapatos, pensou e olhou para sua sandália baixa com strass nas tiras, do jeito que ela sabia que ele gostava. Mas ele tinha razão. O estilo casual e elegante dela era antenado. Engraçado como ele sabia, como ele deduzia certas coisas sobre ela sem nunca terem ido juntos a um shopping ou nunca terem ido fazer compras. Ele a conhecia mais por fotos do que através de encontros pessoais, e mesmo assim, ele aos poucos decifrava seu jeito, seu modo de ser, seu estilo. E ele não escondia que gostava dela do modo como ela era, sem críticas, sem reparos.

Mariana deliciou-se com aquela descoberta. O sorriso brotou de forma espontânea, outro aspecto dela que ele também adorava. A mãe, com o rabo de olho, notou o rosto da filha brilhar, e com a peculiar sabedoria materna não disse nada. Mas ela também sabia, ela sempre sabia.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Internet e credibilidade

A Edna levantou a bola e vou cortar, seguir a discussão mas mudando a ótica. O bom da blogosfera é a forma como discussões são incentivadas.

Há 10 anos o acesso à internet era praticamente inexistente. Telefone celular, então, algo caro e arcaico. Hoje, é possível acessar a internet pelo telefone celular - coisa que faço com certa frequência para checar emails. Em 10 anos - apenas 10 anos -, houve uma fantástica revolução na forma de comunicação e na velocidade da comunicação. O mundo mudou e toda mudança gera aspectos positivos e negativos.
Vejamos os blogs como exemplo. Muito se fala da força transformadora de blogs e na credibilidade dos blogs. Há muitos blogs que simplesmente reproduzem textos de outros sites, fazendo o famoso "recorta e cola". Mas há muitos blogs com excelente conteúdo. A questão da credibilidade não afeta apenas os blogs, mas todo o conteúdo da internet.
Hoje, faz-se uma pesquisa usando o google ou a wikipedia. O primeiro apresenta uma lista de links e locais para achar mais informações. A segunda já apresenta a informação que é incluída por milhões de editores. Mas ela é confiável? Recentemente, uma pesquisa realizada nos EUA revelou que alguns editores da wikipedia alteravam dados para influenciar os leitores. Os verbetes poderiam ser usados como forma de propaganda ou como forma de manipular os leitores.
A visão crítica é fundamental para uma pesquisa bem feita na internet, principalmente quando se fala de trabalhos acadêmicos ou trabalhos de criança para a escola. É preciso ensinar nossos filhos que não se pode simplesmente copiar um texto. É preciso checar a fonte e fazer um resumo do que se encontrou na pesquisa. Dá trabalho, mas pesquisar é uma atividade que dá trabalho. E dará trabalho aos pais incutir esta forma de conduta nos filhos.

domingo, 9 de setembro de 2007

Álvaro de Campos: De la Musique

DE LA MUSIQUE

Ah, pouco a pouco, entre as árvores antigas,
A figura dela emerge, e eu deixo de pensar...

Pouco a pouco da angústia de mim vou eu mesmo emergindo...

As duas figuras encontram-se na clareira ao pé do lago...

...As duas figuras sonhadas,
Porque isto foi só um raio de luar e uma tristeza minha,
E uma suposição de outra cousa,
E o resultado de existir...

Verdadeiramente, ter-se-iam encontrado as duas figuras
Na clareira ao pé do lago?

(...Mas se não existem?...)

...Na clareira ao pé do lago......

17-9-1929

Álvaro de Campos é um dos heterônimos de Fernando Pessoa e este poema datado foi extraído da edição coordenada por Cleonice Berardinelli de "Poemas de Álvaro de Campos" (Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1999).

A figura dela emerge, e eu deixo de pensar. A clareira ao pé do lago, uma livraria, uma estação de metrô, um café no centro da cidade, um encontro casual. Tanto faz, mas o que seria de hoje se aquele encontro não tivesse acontecido? Encontro que existiu e quando a figura dela emergiu, deixei de pensar e passei a sonhar.

sábado, 8 de setembro de 2007

Mar e Nuvens


Deitei-me na areia e fiquei olhando o mar. O mar que não é nem verde nem azul, nem masculino como figura na nossa língua nem feminino como está na língua francesa, nem macho nem fêmea, mas algo assim andrógino. Escapando ao rigor das classificações ele é a vida mas também pode ser a morte. Agressivo, sim, e ao mesmo tempo, envolvente. Sedutor – ah, vamos deixá-lo com os mistérios porque os mistérios são inexplicáveis.”

Este trecho inicia a crônica “Pedra que chora” (Conspiração de Nuvens. Rio de Janeiro : Rocco, 2007, p. 81) do mais novo livro de Lygia Fagundes Telles, cujos textos foram organizados por Suênio Campos de Lucena. Havia lido uma entrevista de Lygia Fagundes Telles e um comentário sobre livro ao longo desta semana (Estado de São Paulo, p. D2, 30 de agosto de 2007). Chamou-me a atenção a afirmação de que escrever serviu-lhe para superar uma fase de profunda angústia e tristeza após a morte do filho.

Comprei o livro esta tarde e já devorei metade dele – estou num feriado literário. Este texto parte da contemplação do mar para falar do Padre José de Anchieta e seus poemas escritos nas areias do litoral brasileiro. O mar. O céu estrelado. A lua. As nuvens no fundo azul do céu da tarde. Todos convidam à reflexão e dão-nos um senso de pequenez, um senso de insignificância diante de uma vasta imensidão, um senso de que há algo mais além de nós mesmos.

Exercem uma atração magnética que nos faz mergulhar no nosso eu mais profundo, como se parássemos diante do espelho e nos olhássemos totalmente nus, mas podendo vislumbrar a nossa própria alma. Convidam-nos a sonhar e sonhos, muitas vezes, são inesperados.

Ontem comecei a ler A invenção de Morel, do argentino Adolfo Bioy Casares, escrito em 1940 (trad. Samuel Titan Jr., 3a. ed. São Paulo : Cosac Naify, 2006). O livro narra o diário apócrifo de um fugitivo da justiça venezuelana, escondido numa ilha deserta no Pacífico. Durante a noite, sonhei com texto e o uma notícia de jornal que tratava do ilhéu. Coisas inexplicáveis do incosciente.

Interessante como o mar, inadvertidamente, tem sido o pano de fundo de minhas leituras – ou talvez seja a tela onde os escritores contemporâneos tem lançado suas pinceladas. Acabo de ler Na Praia (título original On Chesil Beach), de Ian McEwan (São Paulo : Companhia das Letras, 2007), que está cotado para o Booker Prize de 2007. Antes dele, tive em mãos O Mar, de John Banville, já comentado neste blog e vencedor do Booker Prize.

Hoje, deparei-me com este lindo texto de Lygia Fagundes Telles. O mar. Cheio de mistérios, convida-nos a contemplá-lo e a refletir, na sua imensidão e beleza, um reflexo de nós mesmos.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Mais quadrilha...e não é festa junina!

Vou aproveitar o feriado para postar bastante e responder - de forma equilibrada - às críticas sobre o post do Jabor. Vou mostrar alguns equívocos sobre os "maravilhosos indicadores sociais do governo Lula".

Enquanto isto, as quadrilhas continuam a aparecer!

Do blog do Reinaldo Azevedo, ontem, 5 de setembro de 2007:

"Não é pouca coisa. O presidente da Infraero (Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária), Sérgio Gaudenzi, afirmou aos deputados da CPI do Apagão Aéreo que vê indícios de atuação de uma quadrilha dentro da empresa. Sim, isto mesmo: de uma quadrilha. Nada menos. Sabem o que eu lhes sugiro? Que vocês comprem um caderninho, desses de capa dura — para durar mais três anos e meio — e comecem a anotar os problemas de gestão do governo Lula. Ou façam um arquivo de computador. Mas a idéia do caderninho é boa. Dá até para levar em festinha de aniversário. Assim que o primeiro entusiasta do lulismo se manifestar, você o fulmina com suas anotações. Estejam certos: “nunca antes nestepaiz se viu algo parecido”."
Triste, mas é verdade!

Onde há fumaça...

O dito popular é sábio: Onde há fumaça, há fogo!

Ontem, Elio Gaspari escreveu na Folha de S. Paulo que o PT vai defender a Constituinte da Reeleição.

Não sou eu que digo, é o Elio Gaspari.

Mas quando há muita negativa e quando esta negativa é muito enfática, pode desconfiar que por trás disto tudo há fogo. Na política, as coisas nunca são tão claras como parecem.

Aliás, alguém viu a 2a parte da propaganda do Banco do Brasil falando de ações ambientalmente responsáveis? Ou será que ficou só no 3?

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Maturidade e envelhecimento


Minha irmã fez 30 anos ontem. Ultrapassei esta barreira temporal há 6 anos. Como muitos, fiquei chateado, levemente deprimido diante de uma nova realidade. Diria que senti-me um pouco velho. Isto passou, claro, e hoje vejo a atual idade e fase da vida com outros olhos. A maturidade e o envelhecimento não são motivos para achar que estamos perdendo algo. Interpreto esta fase como um novo momento cheio de oportunidades e novas experiências.


Li em alguns blogs uma celebração da vida por pessoas com mais de 30 anos e achei que o tema merecia um post. Talvez não tão inspirado como os textos que li (Alessandra Raed , Bicho Solto - no post "e 29 anjos me saudaram" e Balzaquianas), mas deixo minha singela opinião para discutirmos. Todos os posts indicados foram escritos por mulheres refletindo e fazendo uma retrospectiva de suas vidas.


A maturidade deixou de ser algo assustador e temido - ainda que haja uma propaganda massificante em torno da eterna juventude - e passou a ser algo apreciado. Aprendemos a desfrutar do momento da vida em que nos encontramos, sem ficar chorando ou se lamentando. Outro dia conversava com uma amiga e dizia que prefiro a minha fase atual à minha fase com 20 e poucos anos. Vejo o mundo de forma diferente hoje. Vejo as pessoas de forma diferente hoje. Descobri novos defeitos, mas também descobri coisas novas a meu respeito. Aprendi a entender melhor as pessoas que estão próximas - ou distantes fisicamente, mas sempre próximas em pensamento.


Surpreendi-me, na recente mudança de escritório, com o desapego a certas coisas materiais. Sempre guardei tudo, desde coisas importantes até coisas inúteis. Desta vez, muitas estão indo para o lixo - ou reciclagem se for papel, já que aprendi a ser mais consciente ambientalmente. E o ato de jogar coisas fora, de limpar o peso morto tem me dado nova vitalidade e um renovado senso de liberdade.


Maduro, não encaro certas coisas como fracassos devastadores, mas momentos de aprendizado ao longo desta jornada que chamamos vida.


Digo isto sem esquecer das coisas simples da vida e daquelas oportunidades para brincar e voltar a ser criança. A maturidade que se descortina diante dos meus olhos revelou-se mais interessante e empolgante do que imaginava e abraço estas novas experiências como um aluno sedento por aprender.


(Para quem tiver interesse em ler o artigo sobre Maturidade Feliz, publicado na edição 56 da Revista Simples e mencionado em outro post, deixo o link.)