segunda-feira, 14 de julho de 2008

Cecília Meirelles - Metal Rosicler





Metal Rosicler foi publicado em 1960. Este é o primeiro poema do livro:


1


Não perguntavam por mim,
mas deram por minha falta.
Na trama da minha ausência,
inventaram tela falsa.

Como eu andava tão longe,
numa aventura tão larga,
entregue à metamorfose
do tempo fluido das águas;
como descera sozinho
os degraus da espuma clara,
e o meu corpo era silêncio
e era mistério minha alma -
- cantou-se a fábula incerta,
segunda a linguagem da harpa:
mas a música é uma selva
de sal e areia na praia,
um arabesco de cinza
que ao vento do mar se apaga.

E o meu caminho começa
nessa franja solitária,
no limite sem vestígio,
na translúcida muralha
que opõem o sonho vivido
e a vida apenas sonhada.

(Canções. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2005, p. 147)

A ausência pode não ser física, mas interior. Mergulhada na alma, imersa na metamorfose, pronta para ressurgir e iniciar a nova aventura. Mudar sem deixar vestígio, sem deixar que "a tela falsa" pintada pelos outros influencie "a vida apenas sonhada", imaginada na aparência, mas distante da realidade.

A realidade é única, mas perceptível em sua integralidade, apenas por quem a vive. Os espectadores sempre desenharam na "tela falsa", notando por vezes a ausência, mas jamais compreendendo a ausência em sua completude.

Um comentário:

Fabiola disse...

Ai ausencia de alma....